Proliferar ou diferenciar? Perspectivas de destino das células-tronco
Schwindt TT* et al ,Proliferar ou diferenciar? Perspectivas de destino das células tronco,Jornal Brasileiro de Neurologia, 16(1), 13-19, 2005 (p.13 a 19).
“O estudo das células-tronco (CT) tem-se mostrado uma área bastante explorada nos diversos segmentos da biologia nos últimos dez anos. Esse crescente interesse está relacionado às possibilidades que as CT oferecem em terapias celulares, representando uma revolução no entendimento dos mecanismos de reparo e regeneração tecidual” (p.14)
“As CT podem ser classifi cadas segundo sua potencialidade em toti, pluri ou multipotentes. São chamadas de totipotentes as células capazes de gerar todos os tipos celulares embrionários e extra-embrionários, como o zigoto e o blastômero; as pluripotentes podem originar todas as células que formam um embrião (propriamente dito) e são provenientes da massa interna do blastocisto (CT-embrionárias); são classificadas como multipotentes as células que originam apenas um subgrupo de linhagens celulares, por exemplo, as CT-mesenquimais (CTM) e neurais. Existem ainda células oligopotentes, capazes de gerar células mais restritas a uma linhagem do que as multipotentes, e as unipotentes, que originam apenas um único tipo celular maduro. Estas duas últimas devem ser .consideradas células progenitoras e não-CT. Sendo esta uma área nova, é comum a confusão de conceitos e o uso impróprio das definições acima.” (p.14)
“Mais recentemente, com a descoberta da neurogênese em mamíferos adultos, sugeriu-se a existência de CT-neurais no encéfalo adulto, ocorrendo em dois locais principais: na zona subventricular (ZSV) dos ventrículos laterais, que geram os neurônios do bulbo olfatório e na zona subgranular do hipocampo.” (p.14)
“foram criadas algumas hipóteses que tentam explicar os mecanismos pelos quais a diferenciação celular ocorre. Vale ressaltar que os mecanismos evocados parecem depender da população celular e do tecido analisado. De forma geral, as CT expressam, em sua superfície, muitas moléculas associadas a interações célula-célula e célula-matriz.(p.14)
“Uma terceira explicação baseia-se na pureza e na homogeneidade da população em estudo, ou seja, há a possibilidade de coexistirem distintos tipos de CT e progenitores em um tecido, que contribuiriam para o surgimento dos outros tipos celulares. A contribuição de células entre diversos tecidos também pode ocorrer a partir da ação de uma única CT-pluripotente, que é capaz de dar origem a células de tecidos formados a partir de diferentes folhetos embrionários” (p.14 e 15)
“uma explicação relevante para a regeneração tecidual após aplicação de CT é a liberação de citocinas e fatores trófi cos no local da lesão. Como a maioria das CT é capaz de identifi car e migrar até o local lesado, é clara sua capacidade de responder a fatores quimiotáticos (liberados pelo tecido lesado).”(p.15)
“Nos últimos cinco anos, diversos trabalhos têm fornecido pistas da existência de CT em praticamente todos os tecidos de um organismo adulto, não se tratando apenas de progenitores comprometidos, mas células com capacidade de se diferenciar em tipos celulares não relacionados ao tecido de onde provêm. Se o próprio corpo possui essa gama de células com elevada potencialidade, então por que não ocorre regeneração completa de todos os tecidos, após a lesão aguda ou mesmo nas situações de desgaste natural e envelhecimento?” (p.15)
“O uso dessas células em terapias celulares, para diversos tipos de doenças, traz consigo muitas questões éticas. A primeira delas vem do fato de se utilizar embriões derivados de fertilização in vitro para obtenção das CTEH. A lei de biossegurança número 11.105/05, que foi sancionada em março de 2005, permite que embriões congelados, há mais de três anos, sejam utilizados para pesquisas, desde que os pais façam essa doação. Essa lei corre o risco de ser considerada inconstitucional, conforme o pedido de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3.510), apresentado ao Supremo Tribunal Federal. Isso se deve ao fato de vários grupos, religiosos ou não, lutarem contra o uso de CTEH, por considerarem os embriões congelados vidas em potencial Outra polêmica, em torno do uso dessas células, é a clonagem terapêutica (transferência nuclear), que consiste na fusão de uma célula somática de um indivíduo adulto com um óvulo sem núcleo, gerando, assim, um blastocisto com as características genéticas do doador da célula somática. Dessa forma, poderiam obter-se CTEH feitas sob medida para cada paciente, evitando problemas de rejeição. No entanto, muito se discute sobre a geração de novos embriões para fins terapêuticos, considerando-se que isso poderia incentivar um comércio de embriões. Outro problema ético, relacionado à clonagem terapêutica, é que a técnica seria a mesma para se clonar um indivíduo.” (p15)
“Mas nem todas as células formadoras de colônias são de fato CT-multipotentes. Analisando-se as colônias individualmente, nota-se a heterogeneidade da população em cultura relacionadas à taxa de proliferação e à morfologia. Assim, sugere-se que a medula óssea seja composta pela mistura de células progenitoras mais comprometidas e CT não-comprometidas, capazes de se diferenciar em células das três camadas germinativas.”(p.16)
“Após transplantes sistêmicos, as CTM foram encontradas em diversos tecidos, como músculo e tecido nervoso, sendo que parte sofreu diferenciação in vivo. Também são capazes de repopular, parcialmente, a medula óssea do receptor, previamente irradiado ,Existem outros estudos mostrando que as CTM .quando infundidas no sistema nervoso central (SNC), migram, são integradas e desenvolvem características neurais.”(p.16)
“A descoberta da neurogênese em regiões específi cas do encéfalo adulto, como a zona subventricular (ZSV), o hipocampo e o bulbo olfatório trouxe novas perspectivas para as pesquisas relacionadas à terapia celular e regeneração do sistema nervoso. Pesquisas recentes mostraram que a neurogênese está intimamente relacionada a exercícios físicos e atividades que sejam prazerosas.” (p.16)
“Cada neuroesfera é derivada de uma única célula-tronco que, por divisão assimétrica, dá origem à outra célula-tronco e a um progenitor mais comprometido com uma linhagem específi ca. Cada progenitor dá origem somente a outros progenitores. Assim sendo, apenas uma pequena fração da neuroesfera corresponde às verdadeiras células-tronco; a maioria são progenitores mais comprometido.” (p.17)
“O melhor exemplo de terapia gênica utilizando células-tronco, até o momento, é a sua aplicação em modelos animais para Parkinson. Estudos pré-clínicos com roedores e primatas mostraram que o GDNF (glial derived neurotrophic factor) teve efeito bastante animador em modelos de Parkinson. Após indução de lesão da substância negra com 6-OHDA (6-hidroxidopamina) e MPTP (1-metil-4-fenil-1,2,3,6-tetrahidropiridina) em roedores e primatas, respectivamente, observou-se que a administração local de GDNF causava grande melhora nos testes motores. Além do efeito neuroprotetor do GDNF, esse fator pode também atuar na proliferação celular, gerando novos neurônios na região da lesão.”(p.17)
“Esse tipo de tratamento, além do risco da infecção devido à implantação da bomba de infusão de GDNF, é dispendioso e não está ao alcance da população.” (p.17)
“Os estudos sobre CT têm gerado grandes perspectivas na área da medicina, porém, os resultados ainda são preliminares e por essa razão torna-se necessária muita cautela na execução e divulgação de novas terapias celulares. A geração de falsas expectativas, na população em geral, é solo fértil para um sem número de charlatões venderem terapias enganosas, geralmente a preços aviltantes. As CT constituem modelos ideais para que os mecanismos genéticos e ambientais envolvidos no desenvolvimento dos tecidos possam ser compreendidos. Aumentando o entendimento dos mecanismos moleculares envolvidos na proliferação e diferenciação das CT, finalmente as promessas de sua utilização em diversas terapias celulares poderão ser cumprida.”(p.17)
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